O Estatuto da Igualdade de Direitos e sua aplicação prática
- Leonardo de Almeida
- 26 de out. de 2017
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No entanto, apesar de residirem legalmente em terras lusitanas, uma considerável parcela destes imigrantes brasileiros desconhece ou pouco se utiliza do festejado Estatuto da Igualdade de direitos, erguido pelo Decreto Lei 154/2003. Dentre os direitos neles conferidos - como o próprio nome menciona - podemos citar a possibilidade do residente brasileiro requerer o seu bilhete de identidade, documento muito semelhante ao utilizado pelos portugueses, sendo diferenciado apenas no que concerne ao fato do mesmo não valer como documento de viagem. Ainda no tocante aos direitos conferidos, temos também o de votar e de ser votado em Portugal, direito este que se implementa com o decurso de 3 anos residindo de forma legal, restando ressalvados apenas alguns cargos reservados a cidadãos portugueses. Por último e ora objeto do presente artigo, o Diploma em comento consagra o direito que os estudantes brasileiros possuem de pagar o mesmo valor que os estudantes portugueses a título de propinas nas universidades.
Importante frisar que boa parte das universidades lusitanas não faz distinção entre estudantes europeus e os chamados estudantes internacionais no que se refere ao curso de mestrado e doutorado. Contudo, com relação aos cursos de licenciatura, tem-se quase que uma unanimidade no sentido das cobranças de propinas diferenciadas, sendo certo que um estudante dito internacional chega a pagar anualmente algo em torno de 4 a 5 mil euros a mais do que os nacionais portugueses, por exemplo.
Neste diapasão, impõe-se necessária a aplicação do Estatuto da Igualdade no que concerne aos valores pagos, com vistas a pôr num mesmo patamar os estudantes de ambos os países. O problema surge quanto ao exato momento em que os estudantes brasileiros passam a poder, de fato, exercer esse direito. Numa interpretação simples e objetiva, chegamos à conclusão de que esse direito nasce de imediato, com a concessão da igualdade a partir do momento de seu deferimento. Ocorre que, lamentavelmente não é o que acontece no cotidiano, pois as universidades em geral tendem a exigir dos estudantes brasileiros o prazo mínimo de 2 anos de residência legal em território português, o que fazem baseadas no Estatuto do Estudante Internacional, Decreto Lei 36/2014, sendo válido acrescentar que o Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior Público traz a mesma previsão, o que faz com que estas regras se coloquem em verdadeira rota de colisão com o Estatuto da Igualdade de direitos, na medida em que este NÃO prevê qualquer prazo mínimo a ser cumprido pelo estudante brasileiro. Lamentavelmente, no cotidiano se verifica que foi criada uma espécie de “verdade construída” acerca desse prazo de 2 anos, pelo que muitos estudantes sequer têm conhecimento de que podem fazer valer o Diploma Igualitário que os abriga.
Na visão deste articulista, a exigência mínima de 2 anos prevista no Estatuto do Estudante internacional NÃO se aplica aos estudantes brasileiros, e tal ilação se dá por razões muito simples: O DL 154 é de 2003 e portanto anterior ao DL 36 de 2014, razão pela qual o primeiro deveria trazer em seu bojo tal exigência bienal, ou pelo menos uma menção à possibilidade de Lei posterior regular sua aplicabilidade neste caso, o que não fez, restando claro que a intenção do legislador e dos países acordantes era a de NÃO criar qualquer óbice ao livre acesso à igualdade de propinas no âmbito do ensino, não cabendo a um Decreto-Lei de 2014 - portanto lei posterior e de mesma hierarquia normativa – fazê-lo. A todo o exposto, acrescente-se que o Estatuto da Igualdade foi elaborado e assinado sob a forma de um acordo bilateral entre Brasil e Portugal, não cabendo a uma regra unilateral deste último contrariar o que fora pactuado, sob pena inclusive de entraves diplomáticos desnecessários, considerando ainda que a relação entre estes países sempre se deu no sentido de agregar direitos a ambos e não de suprimi-los, o que somente corrobora a tese deste articulista de que deve sim prevalecer a leitura e aplicação do DL/154 de 2003. Por via transversa, entender de forma contrária seria desestimular o estudante brasileiro, o que feriria de morte o artigo 25 do Tratado de Porto Seguro (Decreto 3.927/2001).
Por derradeiro, é de clareza solar que a negativa de igualdade de propinas vai de encontro também ao histórico Decreto Brasileiro 70.391/72, que foi uma espécie de “embrião” do Estatuto da Igualdade que hoje se busca dar aplicação plena.
Por todo o exposto, a orientação final deste articulista – o qual já obteve parecer favorável da Diretoria Geral de Ensino de Portugal em caso idêntico ao narrado neste artigo - acena no sentido de que os estudantes brasileiros que já estão ao abrigo do Estatuto em tela, devem sempre buscar ajuda especializada para que façam valer seu direito de pagar o mesmo valor anual de propinas, ajudando assim a esclarecer e a pôr um ponto final à tal descabida exigência de 2 anos, a qual vem sendo praticada sem qualquer amparo interpretativo extensivo, ou seja, à luz de um conjunto de normas, conforme já cabalmente demonstrado.
Portugal vem recebendo a cada dia uma maior quantidade de brasileiros, os quais se mudam de forma temporária ou mesmo definitiva para o país, onde buscam, regra geral, uma melhor qualidade de vida ou mesmo uma experiência internacional no âmbito dos estudos.
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